terça-feira, 16 de setembro de 2014

Setembro de 2014 - Ian Mc Ewan




Encontro n° 70, 30/9/2014.



AMSTERDAM 




“No seu canto da zona oeste de Londres e ao cumprir as rotinas diárias em que não dava muita atenção ao que existia à sua volta, era fácil para Clive imaginar a civilização como o somatório de todas as artes, juntamente com o design de qualidade, boas comidas, bons vinhos e coisas do gênero. Mas agora ela parecia ser o que realmente era – quilômetros quadrados de casas modernas e ordinárias cujo principal propósito consistia em sustentar as antenas de TV; fábricas produzindo coisas sem valor para serem anunciadas nas televisões; e, em lúgubres pátios, caminhões fazendo filas para distribuí-las; fora disso, estradas e a tirania do tráfego. Parecia a manhã seguinte de uma festa da pesada. Ninguém gostaria que fosse assim, mas ninguém fora consultado. Ninguém o planejara, mas a maioria das pessoas tinha de viver ali. Vendo aquilo quilômetros após quilômetros, quem poderia imaginar o que eram a bondade e a imaginação, quem poderia imaginar que Purcell ou Britem, Shakespeare ou Milton jamais tivessem existido? Depois que o trem ganhou velocidade e se afastou mais e mais de Londres, ocasionalmente o campo surgia e, com ele, vestígios de beleza, ou a memória dela, até que segundos depois o encanto se dissolvia quando um rio virava um canal com margens de concreto ou se via uma imensa plantação sem sebes e sem árvores. E haja estradas, novas estradas se insinuando sem cessar, sem pejo, como se a única coisa importante fosse ir de um lugar para outro. No que concernia ao bem-estar de qualquer outra forma de vida na Terra, o projeto humano não era apenas um fracasso, mas um erro desde o começo.” Amsterdam, Ian McEwan


Ian McEwan



Nenhum comentário:

Postar um comentário

Escriba su comentario, haga Click en NOME/URL (Nombre), detalle su nombre y gaha Click en PUBLICAR COMENTARIO.
Para deixar um comentário, após escrevê-lo, escolha a identidade NOME/URL, escreva seu nome e clique em PUBLICAR COMENTÁRIO.